Sexta-feira passada um telefonema quase me fez chorar. Pedi demissão da escola em que trabalhei nos últimos quatro anos. Aos dezessete anos, foi um grande presente ser contratada pela melhor escola da cidade. Eu era confundida com os alunos, que tinham dois, no máximo três anos a menos que eu. Pessoas de quem eu me lembrava quando estudei ali, dos 9 aos 14 anos. Podia até ter brincado junto ou conversado na hora do recreio, nas festas.
Nunca me esquecerei das caras assustadas quando eu entrava na sala de aula. Menos ainda das perguntas sobre a minha idade e das reações sempre desacreditadas. "17? Mentiiiiiiiira!" O que você faz? Na Federal? Nooooooossa! Você estudou muito? Estudou aqui na escola? Tem namorado?
Eu era a "tia" da galera, porque era assim que eles me chamavam. A tia que eles encontravam nas festas, na rua. A tia que não repetia roupa, porque eles sempre reparavam no modelito. "Quanto for fazer faxina no armário, lembra de mim, tia!" A tia que matava milhões de árvores gastando tanto papel. Das intermináveis listas, que não sabia chamar atenção, muito menos brigar, e preferia mandar os desinteressados dormirem. "Vai gente, dorme aí, é melhor! A aula tá chata, dorme!"
A tia que fazia de tudo pra ser menos chata. "Ana Paula, não é você. É a matéria. Eu odeio redação". A tia que provocava revoltas com as notas baixas. "Eu só tiro 5. Não vou fazer redação mais não!". "Fulano, vale 8. 5 é um 7, é uma nota média. Tem que praticar mais". A tia que fazia ditado e que parava aulas pra tentar enfiar na cabeça dos alunos que "derrepente" é "de repente" e "concerteza" é "com certeza". A tia que atrasava horrores para devolver as provas corrigidas... Mal sabem eles o que é corrigir aquele tanto de prova e o quanto eu me dedicava nisso.
Sentirei saudades. De tudo. De me chamarem de tia, das reclamações por nota, dos elogios, das declarações de amor e ódio, das risadas, das brigas. Principalmente dos alunos. Dos que gostavam de mim, dos que queriam me matar, dos que me achavam ótima, dos que me achavam péssima. Dos que me elogiavam, dos que me criticavam.
Eu tentei ensinar algo. Acho que consegui. Se eu tiver inspirado alguém na busca pelo estudo, já valeu, porque tudo que eu consegui na minha vida até hoje, foi pelo que me esforcei estudando. Mas é fato que eu aprendi mais do que ensinei. E isso é o mais bonito dessa profissão, é uma via de mão dupla interminável, apaixonante, apesar de cansativa.
Eu poderia contar aqui mil histórias que vão deixar saudades. Mas o post é só um breve homenagem e agradecimento a todos os que me acompanharam e me apoiaram nesses anos.